Entrevista com Vovó Margarita -A morte não existe

Publicado originalmente em: http://templodecura.wordpress.com/2012/05/25/a-sabedoria/

VOVÓ MARGARITA – Uma Guardiã da Tradição Maia

Entrevista a Vovó Margarita: “A morte nao existe”… “Quando quero algo peço a mim mesma”

Entrevista a uma sábia guardiã da tradição maia, faço a tradução para o português.
Ima Sanchez. Publicado em ‘La Contra’, jornal La Vanguardia(Espanhol)

A Vovó Margarita, curandeira e guardiã da tradição maia, se criou com sua bisavó, que era curandeira e milagrera. Pratica e conhece os círculos de dança do sol, da terra, da lua e a busca de visão. Pertence ao conselho de idosos indígenas e se dedica a semear saúde e conhecimento em troca da alegria que isso produz, porque para sustentar-se segue cultivando a terra. Quando viaja de avião e as aeromoças lhe dão um novo copo de plástico, ela se aferra ao primeiro: ‘Não jovem, que isto irá parar a Mãe Terra’. Resume sabedoria e poder, é algo que se percebe com nitidez. Seus rituais, como gritar a terra o nome do recém nascido para que reconheça e proteja seu fruto, são explosões de energia que faz bem a quem presencia; e quando te olha aos olhos e te diz que somos sagrados, algo profundo se agita.

Ela nos diz: ‘Tenho 71 anos. Nascí no campo, no estado de Jalisco (México), e vivo na montanha. Sou viúva, tenho duas filhas e dois netos de minhas filhas, mas tenho milhes com os que pude aprender o amor sem apego. Nossa origem é a Mãe Terra e o Pai Sol. Vim a Feira da Terra(no dia da Terra) para recordar o que tem dentro de cada um.’

-Onde vamos depois desta vida?

-Ui minha filha, ao desfrute! A morte não existe. As morte simplesmente é deixar o corpo físico, se quer.

-Como que se quer…?

-Te pode levar. Minha bisavó era chichimeca, me criei com ela até os 14 anos, era uma mulher prodigiosa, uma curandeira, mágica, milagrosa. Aprendi muito dela.
-Já se vê em Você sabia, avó.

-O poder do cosmos, da terra e do grande espírito está aí para todos, basta tomar-lo. Os curandeiros valorizamos e queremos muito os quatro elementos (fogo, água, ar e terra), os chamamos avôs. A questão é que estava uma vez em Espanha cuidando de um fogo, e nos pusemos a conversar.

-Com quem?

-Com o fogo. ‘Eu estou em ti’, me disse. ‘Já sei’, respondi. ‘Quando decida morrer retornará ao espírito, por que não te levará o corpo?’, disse. ‘Como faço?’, perguntei.

-Interessante conversação.

-’Todo teu corpo está cheio de fogo e também de espírito – me disse -, ocupamos o cem por cem dentro de ti. O ar são tuas maneiras de pensar e ascendem se é ligeiro. De água temos mais de 80%, que são os sentimentos e se evaporaram. E terra somos menos de 20%, que te custa carregar com isso?’.

-E para que quer o corpo?

-Pois para desfrutar, porque mantém os cinco sentidos e já não sofres apegos. Agora mesmo estão aqui conosco os espíritos de meu marido e de minha filha.

-Olá.

-O morto mais recente de minha família é meu sogro, que se foi com mais de 90 anos. Três meses antes de morrer decidiu o dia. ‘Se eu me esqueço -nos disse-, me recordem’. Chegou o dia e lhe recordamos. Tomou um banho, colocou uma roupa nova e nos disse: ‘Agora me vou a descansar’. Se deitou na cama e morreu. Isso o mesmo posso contar de minha bisavó, de meus pais, de minhas tias…

-E você, avó, como quer morrer?

-Como meu mestre Martínez Paredes, um maia poderoso. Se foi a montanha: ‘Ao anoitecer venham por meu corpo’. Se ouviu cantar todo o dia e quando foram a buscar, a terra estava cheia de pisadas. Assim quero eu morrer, dançando e cantando. Sabe o que fez meu pai?

-Que fez?

-Uma semana antes de morrer se foi a recolher seus passos. Recolheu os lugares que amava e a gente que amava e se deu o luxo de despedir-se. A morte não é morte, é o medo que temos a mudança. Minha filha me está dizendo: ‘Fala de mim’, assim que vou a falar dela.

-Sua filha, também decidiu morrer?

-Sim. Tem muita juventude que não pode realizar-se, e ninguém quer viver sem sentido.
-Que merece a pena?

-Quando olha aos olhos e deixa entrar ao outro em ti e você entra no outro e te faz UM. Essa relação de amor é para sempre, aí não tem aborrecimento. Devemos entender que SOMOS SERES SAGRADOS, que a Terra É NOSSA MÃE E O SOL NOSSO PAI. Até há pouco tempo os huicholes não aceitavam escrituras de propriedade da terra. ‘Como vou a ser proprietário da Mãe Terra?’, diziam.

-Aqui a terra se explota, não se venera.

-A felicidade é tão simples!, consiste em respeitar o que somos, e somos terra, cosmos e grande espírito. E quando falamos da mãe terra, também falamos da mulher que deve OCUPAR SEU LUGAR DE EDUCADORA.

-Qual é a missão da mulher?

-Ensinar ao homem a amar. Quando aprendam, terão outra maneira de comportar-se com a mulher e com a mãe terra. Devemos ver nosso CORPO COMO SAGRADO e saber que o sexo é um ato sagrado, essa é a maneira de que seja agradável e nos encha de sentido. A vida chega através desse ato de amor. Se banaliza isso, o que ficará? Devolver o poder sagrado a sexualidade muda nossa atitude ante a vida. Quando a MENTE SE UNE AO CORAÇÃO TUDO É POSSÍVEL. Eu quero dizer algo a todo o mundo…

-…?

-Que podem usar o poder do GRANDE ESPÍRITO no momento que queiram. Quando entenda quem é, teus pensamentos se farão realidade. Eu, quando necessito algo, peço a mim mesma. E funciona.

-Tem muitos crentes que rogam a Deus, e Deus não o concede.

-Porque uma coisa é ser “pedinte” e outra, ordenar-te a ti mesmo, saber que é o que necessita. Muitos crentes se voltam dependentes, e o espírito é totalmente livre; isso se tem que assumir-lo. Nos ensinaram a adorar imagens em lugar de adorar-nos a nos mesmos e entre nos.

-Enquanto não te harte de ti mesmo.

-Devemos utilizar nossa sombra, ser más ligeiros, afinar as capacidades, entender. Então é fácil curar, ter telepatia e comunicar-se com os outros, as plantas, os animais. Se decide viver todas tuas capacidades para fazer o bem, a vida é deleite.

-Desde quando sabe?

-Momentos antes de morrer minha filha, ela me disse: ‘Mamãe, carga teu sagrado cachimbo, tem que compartir tua sabedoria e vai viajar muito. Não tema, eu te acompanharé’. Eu vi com muito assombro como ela se incorporava ao cosmos.
Experimenté que a morte não existe. O horizonte se ampliou e as percepções perderam os limites, por isso agora posso ver-la e escutar-la, crê possível?

-Sim.

-Meus antepassados nos deixaram aos avós a custodia do conhecimento: ‘Chegará o dia em que se voltará a compartir em círculos abertos’. Creio que esse tempo chegou.

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